
Estudo mostra que a agrofloresta é economicamente viável no Cerrado
Os Sistemas Agroflorestais (SAFs) são uma solução baseada na natureza promissora para a produção de alimentos e restauração dos ecossistemas do Brasil, uma vez que dão conta de vários problemas relacionados aos sistemas alimentares, ecológicos e sociais do país.
SAF é uma abordagem produtiva e uma forma de uso e ocupação da terra em que árvores são plantadas ou manejadas em associação com culturas agrícolas e forrageiras, cumprindo funções ambientais enquanto produz alimentos. Ou seja, é uma estratégia de produzir enquanto se restaura. Esse tipo de sistema é principalmente implementado por agricultores familiares. Dentre os principais benefícios dos SAFs, vale destacar:
- Melhoram a qualidade do solo, água e ar do local e restauram a vegetação;
- São mais resilientes às mudanças climáticas do que monoculturas e contribuem para mitigação das emissões de carbono;
- Geram renda para agricultores familiares e promovem a segurança alimentar e nutricional.
Um novo tipo de agrofloresta
No Brasil, agroflorestas já são uma realidade em diferentes biomas. Os assentamentos da Reforma Agrária Abril Vermelho e João Batista II no Pará mostram seu sucesso na Amazônia. Lá, o projeto implementado com auxílio do WRI Brasil combina SAFs com a abordagem da Regeneração Natural Assistida (RNA) em um território de 11 mil hectares e mais de 700 famílias. O resultado: renda é gerada para os agricultores, assim como a paisagem degradada é restaurada.
Todavia, os SAFs comuns nem sempre são facilmente adaptáveis a outros biomas brasileiros. É o caso do Cerrado: o bioma com características campestres e savânicas exige sistemas diferentes dos implementados nas densas florestas da Amazônia ou Mata Atlântica.
Discutir SAFs para a realidade do Cerrado é especialmente relevante, dada a importância e sensibilidade do bioma. Ele é o segundo maior bioma brasileiro em extensão e é considerado um hotspot de biodiversidade. O território cerratense abriga 30% da biodiversidade brasileira e 5% da mundial, rendendo a ele o posto de savana mais rica em biodiversidade do mundo. Todavia, ele é um bioma extremamente degradado: já perdeu 49% de seu território para a monocultura de commodities. Hoje, é caracterizado por um solo severamente degrado devido às suas formas de exploração.
É nesse cenário que surgem os Sistemas Agrocerratenses, conhecidos também como os SACIs.
O esforço de adequação dos SAFs à realidade do Cerrado foi liderado por organizações do terceiro setor e instituições de ensino, como o Instituto Federal de Brasília (IFB), a Associação dos Produtores Agroecológicos do Alto São Bartolomeu (Aprospera) e outros. Desde 2022, os SACIs já foram implementados em assentamentos da Reforma Agrária em 5 estados brasileiros: Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

Uma oportunidade economicamente viável
Sabe-se que o modelo dos SACIs é benéfico para a natureza e o clima, mas, para perdurar como um modelo que pode ser replicado e escalado, é também necessário que ele seja economicamente viável. O trabalho “Estudo de viabilidade econômica de SACIs (Sistemas Agrocerratenses) no Cerrado brasileiro”, realizado pelo WRI Brasil e WWF –Brasil, se debruça sobre esse tema. O estudo faz parte da publicação "Sistemas agroflorestais: Salvaguardas no contexto brasileiro e viabilidade econômica no Cerrado", publicado pela The Nature Conservancy (TNC) Brasil, fruto da iniciativa Inovação Financeira para Amazônia, Cerrado e Chaco (IFACC). Ela tem como objetivo despertar o interesse de bancos, empresas da cadeia produtiva, gestores de ativos e demais instituições para as oportunidades econômicas e socioambientais oferecidas pelos Sistemas Agroflorestais (SAFs).
O estudo calculou a viabilidade econômica de dois modelos de SACIs implantados no Cerrado. Os custos de implantação e manutenção assim como o potencial de geração de receitas de cada modelo foram variáveis importantes utilizadas para compreender a viabilidade dos SACIs. Os resultados do estudo encontraram indicadores financeiros sólidos e com boas possiblidades de retorno para os proprietários. Logo, eles possuem potencial de escalabilidade e replicação.
Um importante indicador financeiro é a Taxa Interna de Retorno (TIR), a qual mede a rentabilidade de um investimento. O estudo encontrou, para os dois modelos de SACIs, uma TIR significativamente maior que Taxa Mínima de Atratividade (TMA), taxa que indica a remuneração mínima que um investimento deve ter para valer a pena economicamente. O que significa que as agroflorestas do Cerrado possuem grande potencial de gerar retornos maiores do que o capital investido inicialmente.
Vale destacar que ser economicamente viável não basta para os SACIs se transformarem em negócios bem estabelecidos. O apoio de políticas públicas e o financiamento pelo setor público e privado serão essenciais para que superem barreiras e sejam implementados em larga escala. Além disso, o investimento na área de pesquisa, desenvolvimento e inovação (P&D) também será essencial para o sucesso desses sistemas.
Construir uma economia sustentável no Cerrado
Avaliações financeiras de arranjos de restauração e produção no Cerrado, como esta dos SACIs, são fundamentais para a construção de políticas públicas e mecanismos econômicos que possibilitem a expansão da regeneração do bioma. A tecnologia social dos SACIs não só restaura, mas também fortalece as comunidades locais e as motiva a restaurar. Eles têm potencial de gerar importante impacto social, pois geram renda e promovem segurança alimentar e nutricional. Também valorizam conhecimentos coletivos e ancestrais, impulsionando a diversidade cultural e alimentar do bioma
O Cerrado é um bioma essencial para a vida no Brasil e na América do Sul e assegurar sua restauração e permanência de seus povos tradicionais são questões urgentes. O resultado desta e de outras pesquisas mostram que é possível construir uma economia diferente no Cerrado: uma que proteja seus recursos naturais e fortaleça suas comunidades locais.